domingo, 29 de junho de 2014

Adolpho Ducke - De entomologista a botânico.

Adolpho Ducke

Introdução

Poucas pessoas se dedicaram tanto a aumentar o conhecimento científico como Adolpho Ducke, natural de Trieste, filho de um engenheiro, cedo perdeu o pai tendo que laborar para o próprio sustento. Veio para o Brasil ainda jovem, radicando-se um período curto em São Paulo. Posteriormente regressou à Europa, iniciando seus estudos em entomologia, tendo trabalhado com Heinrich Friese, a maior autoridade em himenópteros. 

No ano de 1899, o Dr. Emilio Goeldi, direto do museu paraense, em viagem pela Europa, contratou diversos técnicos destinados a aumentar o corpo de servidores do museu, naquele momento em fase de completa reorganização. Entre os nomes figurava o do Sr. Adolpho Ducke, que foi contratado para o cargo de auxiliar do departamento de zoologia, ficando lhe responsável por cuidar da parte de coleta e preparações das coleções de entomologia.

Dotando de grande capacidade de trabalho o jovem auxiliar em curto espaço de tempo aperfeiçoou-se nos seus conhecimentos científicos, dedicando-se ao estudo de vespas e abelhas. Publicou seu primeiro trabalho nesta especialidade em 1900, a qual seguiram uma série de obras publicadas nas mais renomadas revistas especializadas da época. Pela sua profunda dedicação a esta matéria Ducke veio a torna-se um dos maiores especialistas no assunto.

A Influência de Huber.
Jacques Huber

Embora seus estudos fossem focados no ramo da entomologia, Ducke, desde seus primeiros tempos de atividade no museu, sofreu a influência de Jacques Huber, o eminente botânico desta instituição. Assim já em sua primeira excursão a Mazagão, no atual território do Amapá, em 1900, constam ao lado dos numerosos espécimes entomológicos, alguns exemplares de herbário coletados por incumbência de Huber.

Este fato fica claro na introdução do trabalho: "VII - Plantae  Duckeanae austro-guyanenses", Bol. Mus. Goeldi 5 (2):294, 1909, onde Huber informa: "De alguns anos para cá, o Sr. Adolpho Ducke, entomologista do Museu Goeldi, aproveitou  as suas viagens  ao interior do estado, para colecionar além de insetos, um bom número de plantas secas, ...".  Referindo-se ao período 1902 - 1907.


Desde o início de sua carreira, Ducke foi essencialmente o pesquisador de campo. Um autêntico naturalista. A relação das suas viagens empreendidas pelo mesmo  dispensa qualquer comentário, tendo inclusive prejudicado sua saúde. Em setembro de 1905, após ter regressado de uma viagem ao Alto Rio Negro, teve de ser enviado ao sul, onde permaneceu quatro meses a fim de se recuperar. Realizando na ocasião coletas em Barbacena, no estado de Minas Gerais.

Longe de restringir seu trabalho a simples atividade de coleta. Ducke era dotado de um excepcional senso de equilíbrio e divisão de trabalho, que aliado a sua capacidade de produção fora do comum, permitiu-lhe valorizar o fruto de suas coletas na forma de publicações de profundo rigor científico.

As fases do trabalho de Ducke

O entomologista

O período inicial da sua carreira é caracterizado, então, como uma atividade de pesquisa fundamentalmente dedicada ao ramo da entomologia, secundada, porém, por uma tendência à coleta de material botânico. Esta tendência iria evoluir através dos anos e a reciprocidade sempre crescente com o botânico Huber levaria, finalmente, a uma integral transformação dos interesses e das atividades do pesquisador. 

Esta transformação pode ser sentida  claramente acompanhando-se a relação dos trabalhos publicados até 1914, ano em que faleceu Jacques Huber. Até esta época constam na bibliografia de Ducke exclusivamente obras entomológicas. Após a morte de Huber, repentinamente, Ducke sentiu-se na obrigação moral de "continuar a obra do grande mestre", prosseguindo com o estudo e classificação botânica das espécies arbóreas da flora amazônica. Como não havia no museu outro entomologista de larga experiência para orientar Ducke, é compreensível que ele tenha sido atraído a esfera de influência intelectual de um mestre como Huber foi, sendo Ducke um jovem pesquisador quando chegou ao Museu Goeldi. Neste ambiente uma inicial tendência encontrou campo aberto para evoluir até o grau de especialização. 

O botânico

A partir de 1915, ano seguinte do falecimento de Huber, a obra de Ducke passa a ser exclusivamente botânica. Já neste ano  é publicada  a primeira  série  das "Plantes nouvelles ou peu connues de la région Amazoniènne" , continuada até 1939 com a décima primeira série. 

Dedicando-se inteiramente a continuação da obra de mestre, Ducke veio inclusive a sucedê-lo na direção da seção de Botânica do Museu paraense, inicialmente em caráter provisório, a partir de 18 de fevereiro de 1914, e depois em caráter definitivo até sua saída do Museu em 1918, quando seguiu para o Rio de Janeiro. 

Analisando a bibliografia de Ducke no período posterior a 1915 e até 1930, um fato chama atenção: a relativa diminuição de trabalhos publicados em comparação com a abundância que pode ser observada até 1910. A interpretação deste fato é evidente. Após ter atingido a plena maturidade na especialidade entomológica, uma transmutação para o campo da botânica inevitavelmente teria que acarretar um período de readaptação. Fora a ausência da orientação do mestre falecido e as responsabilidades como chefe da seção que recaiam sobre seus ombros. Seguiu-se um período de consciencioso aperfeiçoamento na nova especialidade e um exaustivo trabalho de análise do vasto material acumulado e sempre as acrescido de novas coletas, absorveram anos de persistente dedicação. Aliado ao fato da sua mudança para o Rio de Janeiro. Em 15 de outubro 1918 deu-se o embarque para o sul, e gozo de licença. As funções no Museu Paraense, não seriam jamais reassumidas, pois em 31 de outubro do mesmo ano, Ducke aceitava um contrato de três anos para servir como chefe da seção de Botânica e Fisiologia  Vegetal do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. 

Nova fase de trabalho: Jardim Botânico do Rio de Janeiro






O contrato foi prorrogado por mais três anos em 1921 e em 1 de novembro de 1924, com era feita a nomeação efetiva do cargo. Tendo alcançado uma situação funcional estável, Ducke casou-se no dia 6 de dezembro de 1924 com D. Josefina Corrêa Lima, cearense que viria lhe acompanhar de forma abnegada até os últimos momentos de sua vida. 

Sua transferência para o Jardim Botânico do RJ, não interromperam seus trabalhos na Amazônia que estavam em andamento, pois já no dia 3 de junho de 1919, Ducke desembarcava novamente em Belém, incumbido de "organizar uma coleta metódica de material botânico, vivo e seco, destinado às plantações e o herbário do Jardim Botânico - RJ. Tendo regressado ao Rio de Janeiro somente em de março de 1920, trazendo consigo uma farta coleção de plantas secas e 39 espécies de plantas vivas.

 Em sua próxima viagem ao Amazônia realizou-se em agosto de 1922, com recomendações de coletar o maior número possível de plantas vivas, tendo seu regresso ao Rio de Janeiro em 20 de novembro de 1923, com 120 plantas vivas e 1900 exemplares de herbário.

Já em 1938 sua relação com a diretoria do Jardim Botânico, por questões de temperamento, não eram tão amistosas. esta animosidade levou-o a solicitar um ano de licença especial, entrando em gozo da mesma em 7 de dezembro de 1938. Ainda em gozo de sua licença e em consequência de um processo administrativo instaurado contra o diretor, foi-lhe imposta uma suspensão, que chegou a cumprir, mas posteriormente  foi relevada por deliberação do Sr. presidente da República.

Em virtude de novas designações para Amazônia e da sua situação de fraca inimizade com a diretoria do Jardim Botânico, Ducke não fazia nenhum empenho de retornar ao Rio de Janeiro, tendo praticamente fixado residência em Manaus, fazendo a partir dai excursões periódicas pelo alto Amazonas.

Sua estadia na Amazônia foi sendo prorrogada por períodos de mais de um ano até 1945, ano em que foi aposentado, em 28 de fevereiro, por ter atingido a idade compulsória.


Aposentadoria 


Sua aposentadoria como naturalista não significou um fim de suas atividades botânicas. Por ocasião de sua passagem rápida por Recife, em 1937, a atenção de Ducke foi despertada pelo fato de ocorrerem nas matas das imediações desta cidade espécies tipicamente amazônicas. Esta observação induziu-o a investigar por conta própria o assunto, realizando pesquisas nos arredores de Recife, colaboração com o botânico Dárdano de Andrade Lima, 1947 a 1950. 


Recorreu então Ducke ao Conselho Nacional de Pesquisas, para a estudar a até então pouco conhecida flora de Pernambuco. Desta data em diante até sua morte, Ducke contou com o apoio do CNP, que sempre aprovou e prestigiou as suas iniciativas. 

Em 1954, ainda sob os auspícios do Conselho Nacional de Pesquisas,  foi encetado um novo programa de trabalho que seria o último do ilustre botânico - o estudo botânico sobre o Ceará. 

Os estudos de Ducke no Ceará concentraram-se principalmente nos tabuleiros do litoral e serras próximas a Fortaleza. Estes estudos continuaram normalmente até nos anos de 1955 a 1957, alternando viagens de curta duração ao Rio de Janeiro e a Belém, a fim de consultar herbários. 

A partir de 1958, os estudos foram concentrados na flora serrana mediante coletas executadas  por um coletor habilitado, cedido pelo Instituto  Agronômico do Norte. 

O último relatório sobre estes trabalhos, remetidos ao Conselho Nacional de Pesquisas é assinado em 30 de dezembro de 1958. Poucos dias depois, em 5 de janeiro  de 1959, falecia Adolpho Ducke, em terras alencarinas. 

Ducke foi durante toda sua vida um trabalhador incansável,  deixando para a posteridade  uma vasta lista de trabalhos publicados, com descrição de mais de 900 espécies  botânicas novas. Infelizmente não chegou a reunir num trabalho conjunto toda vasta soma de conhecimentos a respeito da fitogeografia  e da distribuição das espécies, adquiridos em mais de 40 anos de trabalhos de campo e gabinete. 



Fonte: Adolpho Ducke, traços biograficos, viagens e trabalhos.