quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Plantas Nativas - Dyssochroma viridiflorum

Dentre as muitas expedições pelo Movimento Pró-Árvore ("Idas ao Mato"), Guaramiranga pela riqueza de sua Biodiversidade sempre nos presenteia com alguma preciosidade. Guaramiranga é um município brasileiro do estado do Ceará. Está localizado na região serrana do estado, microrregião de Baturité e mesorregião do Norte Cearense, a 110 km da capital do estado, Fortaleza. Segundo estimativa de 2014 do IBGE, o município tinha cerca de 3 812 habitantes e 59,436 km² de área. Sua sede se localiza a 865 metros de altitude. A cidade está situada na Área de Proteção Ambiental (APA) do Maciço de Baturité. É o menor município do Ceará.
Serra de Guaramiranga


O topônimo Guaramiranga vem do Tupi guará (vermelho) e miranga ou piranga (garça), significando Pássaro Vermelho. Sua denominação original era Conceição, porém, desde 1890, possui o nome Guaramiranga. As terras da atual Guaramiranga eram habitadas por várias etnias. A principal delas era a Kanyndé. Com a criação da Missão da Palma, durante o século XVIII, para a evangelização dos silvícolas, e a expansão da pecuária e as plantações de café no século XIX, consolidou-se o centro urbano que hoje se chama Guaramiranga. A região possui uma vegetação diversificada, variando desde a caatinga arbustiva densa, floresta subcaducifólia tropical, floresta úmida semi-perenifólia, floresta úmida semi-caducifólia, floresta caducifólia à mata ciliar. Durante o mês de fevereiro fizemos uma trilha a Cachoeira do Poço da Veada, para registro e levantamento florístico do percusso. E entra as muitas espécies registradas se encontra uma muito especial: Dissochroma viridiflorum, espécie identificada pelo Antonio Sergio, agrônomo e botânico taxonomista, também ligado ao Movimento Pró-Árvore.


Dissochroma viridiflorum 


Flor da Dyssochroma viridiflorum  (Sims) Miers,
encontra-se fechada pois tem antese noturna,   visto que é polinizada por morcegos.

Dyssochroma viridiflorum é uma planta da família das Solanaceas Hunziker, 1979 ; Knapp et al ., 1997 ), endêmica da Mata Atlântica, ocorrendo em oito estados brasileiros, incluindo o Ceará no nordeste do Brasil. Tanto suas flores são polinizadas por morcegos como seus frutos também são dispersos por estes mamíferos alados. Poucas plantas neotropicais parecem depender do mesmo tipo de animal para polinizador como para dispersor de sementes, e os casos conhecidos referem-se principalmente a aves como os agentes nessas duas fases do ciclo reprodutivo da planta. Por exemplo, sabe-se que algumas espécies de Bromeliaceae e Costaceae são polinizadas por Beija-flores, e dispersas por aves passeriformes e pequenos mamíferos. ( Fischer e Araujo, 1995 ; Buzato et al ., 2000 ;.. I. Sazima, pers obs). Como a distribuição de flores e frutas de morcegos entre ordens de angiospermas é notavelmente concordante ( Fleming, 1988 ), seria de se esperar que os mesmo seriam encontrados dentro das mesmas ordens, famílias, e em certos casos, até mesmo gêneros. Como algumas espécies de Cactaceaes da America do Sul e Central são polinizadas, e em certa medida, dispersos por morcegos Phyllostomidae. ( Petit, 1997 ; Martino et al ., 2002 ). Phyllostomidae é uma família de morcegos encontrada em regiões tropicais e subtropicais das Américas, que se caracteriza por possuir folha nasal. Este apêndice pode ser lanciforme ou ovalado. Os morcegos filostomídeos participam de todas as funções e serviços ecossistêmicos nas quais morcegos em geral estão envolvidos, desde a dispersão de sementes até a predação de insetos. ( Kunz TH, de Torrez EB, Bauer D, Lobova T, Fleming TH. 2011. )

Dyssochroma viridiflorum


A que avistamos em Guaramiranga, a caminho da Cachoeira do Poço da Veada, ocorria como hemiepífita ou saxícola em área próxima de riachos. Sobre a fenologia, pelo observado, parece que Dyssochroma viridiflorum floresce o ano todo, um padrão fenológico definido como contínuo (Newstrom et al . (1994 ).
Tal padrão fenológico é raro em espécies polinizadas por morcegos neotropicais, como registrados em vários estudos. Um dado sobre D. viridiflorum é que uma planta pode suportar brotos, flores abertas, frutas e frutos maduros em desenvolvimento, tudo ao mesmo tempo, proporcionando assim refeições noturnas para ambos os morcegos nectarívoros e frugívoros.  Um indivíduo pode produzir 1-10 flores por noite, uma característica que promove o modo de linha de estratégia de forrageamento e parece muito difundida entre as espécies polinizadas por morcegos ( Heithaus et al ., 1975 ; Sazima et al ., 1999 ). O mais importante é saber que para preservamos é essencial conhecermos. A natureza esta repleta de intrínsecas relações como essa.  


Fruto da Dyssochroma viridiflorum comido por morcegos frugívoros, dispersores de suas sementes.


Fontes:


Stehmann, J.R.; Mentz, L.A.; Agra, M.F.; Vignoli-Silva, M.; Giacomin, L.; Rodrigues, I.M.C. Solanaceae in Lista de Espécies da Flora do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.floradobrasil.jbrj.gov.br/jabot/floradobrasil/FB26120>. Acesso em: 19 Fev. 2015.

Sazima, M.; Buzato, S.; Sazima, I. Dyssochroma viridiflorum (Solanaceae): a Reproductive Bat-dependent Epiphyte from Atlantic Rainforest in Brasil. Annals of Botany 92: 725-730,2003.

 Kunz TH, de Torrez EB, Bauer D, Lobova T, Fleming TH. 2011. Ecosystem services provided by bats. Annals of the New York Academy of Sciences 1223(1):1-38.

<http://pt.wikipedia.org/wiki/Guaramiranga> Acesso em: 19 Fev. 2015.




sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Quanto tempo mais o Cocó resistirá?

Parque Ecológico do Rio Cocó, berçário de inúmeras espécies marinhas e pouso de pássaros migratórios e Fauna silvestre.

Com quase trinta anos de luta o Cocó é sem dúvidas baluarte de luta pela preservação ambiental na cidade de Fortaleza, e vem a longo dos anos resistindo a poluição e a especulação imobiliária, hoje seu maior inimigo.

O primeiro ponto do rio Cocó a ser protegido e aparelhado foi criado em 29 de março de 1977, posteriormente em 11 de novembro de 1983, o decreto municipal número 5.574 deu o nome de Parque Adhail Barreto. Anos depois, já em 1989, o decreto estadual 20.253 cria o Parque Ecológico do Cocó, sendo expandido em  de junho de 1993, atualmente abrangendo uma área de 1,155,2 hectares.  

Cocó tem como seu maior inimigo a especulação imobiliária em seu entorno. 

Diversas entidades civis lutam pela legalização do Parque como (UC) Unidade de conservação, medida para preservar a área prevista em estudo pelo Conpam em 2008 que compreende 1.312 hectares de Fauna, Flora e recursos hídricos, hoje tão em pauta no país de vido as secas. Incluindo as dunas milenares que segundo o SALVE DUNAS DO COCÓ, a idade das dunas que pensou-se em 1.400 anos, são na verdade de 2.200 anos para as dunas do Cocó e 1.800 para as dunas da Sabiaguaba, segundo estudo feito pela USP na datação utilizando método de Termoluminescência. Patrimônio ambiental de valor incalculável que poderá perder uma de suas áreas mais importantes na construção da Ponte estaiada, obra ainda do governo do ex-governador Cid Gomes. 

Choró-boi ou Choró-grande (Tabara major) um dos representantes da rica e complexa Fauna do Cocó.

Perda significativa da cobertura vegetal em Fortaleza, avaliada em 2002 pela (PMF), quando do inventário Ambiental, mostrou que de 1968 a 2002, cerca de 70% da cobertura natural foi perdida. O que impacta direto na qualidade de vida da população. A Organização Mundial da Saúde, sugere 12m² de área verde por habitante, enquanto Fortaleza hoje tem menos de 3m². Muitas cidades brasileiras já atingiram esse patamar indicado pela (OMS), enquanto Fortaleza continua regredindo. Tais intervenções nas áreas verdes têm consequências diretas no clima da cidade e formação de ilhas de calor sendo detectadas em alguns bairros (MOURA,2008). A temperatura também vem aumentando nos últimos anos, em algumas áreas valores estáveis de aumento da ordem de 4 graus centígrados (MOURA, 2008). Para termos uma comparação, as modelizações do Painel Intergovernamental de mudanças climáticas - IPPC, da ONU, que vem realizando prognósticos e criando cenários futuros em termos de aquecimento global, indica um aumento da ordem de 1 grau centígrado nos próximos decênios, o que já implicaria em desastres ambientais. Fortaleza já apresenta valores três vezes maiores do o apontando para a média global pelo IPPC. É comum acompanhar pelos noticiários ou pelas redes sociais o corte de árvore na cidade ou intervenções feitas dentro da área do Parque.  

Acampamento de ocupação do Cocó contra a construção dos viadutos nas avenidas Eng. Santana Jr. e Antonio Sales.



Diante da escassez que o país vive especialmente a região nordeste, e o aumento considerável da temperatura a cada ano, a qual todo fortalezense conhece de perto, o Parque do Cocó passa ter uma relevância ainda maior.


Este ano no dia 29 de janeiro ocorreu a instalação do Fórum permanente pela implantação do Parque do Cocó, na Procuradoria da República no Ceará. Essa iniciativa histórica vem num momento delicado para o Cocó, reunindo atores implicados na criação da reserva legal. Tendo com fundo a proposta do governador de transformar o Parque em um mosaico de diferentes UCs, condição que permitiria construções dentro da área. Entretanto como frisou o professor de Geografia da Universidade Federal do Ceará, Jeovah Meireles, uma APA (área de preservação ambiental) dentro de uma APP (Área de preservação permanente) é incompatível, pois segundo o Código Florestal todo o Cocó já figura como (APP).


Abelha do gênero Xylocopa

Até hoje várias gestões estaduais passaram sem legalizar o parque de fato. Apesar de a área sofrer com forte pressão da especulação imobiliária, o valor desta área vai muito além como já explanado até agora. O Cocó desde sua nascente em Pacatuba até sua foz é patrimônio do povo cearense, em todos os municípios que drenam suas águas. Precisamos preserva-lo pensando no futuro, como fonte hídrica e de vida.

Parque Ecológico do Rio Cocó - Lugar mais lindo de Fortaleza, Ceará.


Fontes:

MOURA, M. O. O clima urbano de Fortaleza sob o nível do campo térmico. 2008. Dissertação (Mestrado
em Geografia) – Departamento de Geografia, UFC.
2008.

PINHEIRO, M. V. Evolução geohistórica das dunas de Fortaleza. 2009. 210p. Dissertação (Mestrado, em
Geografia) – Departamento de Geografia da UFC, 2009.

PMF. Prefeitura Municipal de Fortaleza. Inventário Ambiental de Fortaleza. 2002.

CLAUDINO-SALES, VANDA. Paisagem dunar em área urbana consolidada: natureza, Ciência, e Política no espaço urbano de Fortaleza, Brasil.  Departamento de Geogranfia da UFC, 2010.

Jornal O Povo > acesso em : 13 de fevereiro de 2015.

(http://salvemasdunasdococo.blogspot.com.br/). Acesso em : 13 de fevereiro de 2015.



terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Nossas abelhas nativas– exímias polinizadoras - Matéria que saiu no jornal O Estado

Arapuá - Trigona spinipes polinizando uma Crotalaria retusa

Umas das doces lembranças que tenho de minha infância, nas idas à casa de minha vó em Pacajus, era o delicioso mel que ela sempre tinha guardado fruto das nossas abelhas indígenas, fluido, levemente ácido e floral. Mel de jandaíras e Canudos e outras tantas joias aladas especialistas em polinizar nossa flora nativa. A verdade é que as abelhas polinizadoras incansáveis estão desaparecendo, desde o começo dos anos 90 tem se observado o sumiço rápido e até então misterioso no mundo todo. Fato preocupante, dado a importância delas não só pelos produtos que nos fornecem, mas também pelo seu valioso trabalho como polinizadoras, tendo esses agentes um papel chave na manutenção da diversidade, pois são essenciais para a maior parte das plantas com flores, e assim para o próprio ecossistema, sustentando as populações de plantas que muitos outros animais utilizam como alimento e moradia. (Sheperd et al. 2003, Klein et al. 2007). Incluindo aí o próprio homem, estima-se que um terço da alimentação humana dependa direta ou indiretamente da polinização realizada por abelhas. Hoje se sabe que o desaparecimento das abelhas está ligado ao uso de agrotóxicos.
 Nossas abelhas nativas estão numa situação muito pior. Jataís, Uruçus, Tiúbas, Irapuás, Jandaíras, Canudos e outras sofrem com a predação do ambiente, coleta indiscriminada de colônias na natureza ou do mel sem manejo adequado e com o já citado o uso dos agrotóxicos. Outro ponto é lapso cultural muito influenciado pela introdução e criação das abelhas melíferas do gênero Apis, desde o século XVIII, que trouxe junto toda uma bagagem de manejo e criação estabelecida em torno do gênero 500 anos antes na Europa, sufocando de certo modo, o estudo, manejo e criação dos Meliponíneos.
As abelhas sem ferrão das quais estão incluídas nossas abelhas indígenas, são insetos sociais de ampla distribuição geográfica e diversidade.  O conhecimento sobre as abelhas sem ferrão é muito antigo quando comparado com as atividades envolvendo, na América, as abelhas Apis melífera (popularmente chamadas de europeias, italianas ou africanas). Os povos indígenas há séculos se relacionam com os meliponíneos (abelhas nativas), seja criando-os ou explorando-os de forma predatória. Essa herança cultural indígena esta presente até mesmo nos nomes populares das abelhas: Tataíras, Guarupu, Mombuca e tantas outras.  Engraçado que o alimento produzido por elas não pode nem ser chamado de mel. A legislação vigente se baseia em padrões físico-químicos do mel produzido por abelhas estrangeiras. Para ser considerado como mel, o produto das abelhas indígenas deveriam ter umidade máxima de 20% - mas chega a 35% - e pelo menos 65% de açúcares redutores (tem 50%). Culpa de um regulamento de 1952, da época de Getúlio Vargas. (Janaina Fidalgo).

Uma das habilidades especiais das abelhas nativas é a polinização por vibração do abdômen. Trata-se de um interessante e eficiente método de coleta de pólen pelas abelhas em flores com anteras tubulares. Nesse tipo de coleta de pólen, as abelhas usam sua musculatura do abdômen para vibrar as anteras e liberar o pólen.  Cada vez mais é necessário expandir o conhecimento sobre nossas abelhas indígenas e as interações das mesmas com as plantas nativas e agrícolas, esses estudos servirão como base para a conservação desses polinizadores e nos processos por eles desempenhados nos ecossistemas e na agricultura.  Essas preciosidades aladas de grande função ecológica merecem continuar voando por ai polinizando e produzindo esse mel delicioso, obra que alquimista nenhum é capaz de elaborar.





Referências
Nunes-SILVA, PATRICIA; HRNCIR, MICHAEL& IMPERATRIZ-FONSECA, VERA LUCIA. 2010 A Polinização por abdômen. Universidade de São Paulo, 141-143.

VILLAS-BÔAS, JERÔNIMO. 2012. Manual tecnológico Mel abelhas sem ferrão. Instituto sociedade População natureza. 11-19